Introdução:
Se tem algo que acho muito legal, é quando identificamos uma personalidade autoral em trabalhos especificos. Quando por exemplo basta escutarmos um riff em determinadas musicas para sabermos que se trata de uma banda ou músico, ou um paragrafo para saber quem o escreve. Alguns designers de jogos, conseguem imprimir essa personalidade em seu portfólio, e é basicamente isso que conseguimos ver na série dos Ts de Tascini: Tzolkin, Teotihuacan e Tekhenu (temos ainda o Trismegistus mas considero um caso um pouco a parte)
Tekhenu é o mais novo jogo nessa série, que de cara, assim como os outros, traz as credenciais de um Euro clássico da escola Italiana, uma enorme salada de pontos com várias possibilidades estratégicas. Mas a assinatura de Tascini, vem em mais uma excelente implementação de mecanismos cíclicos que direcionam os turnos dos jogadores e imprimem a dinâmica do jogo. Se em Tzolkin as engrenagens ditavam o planejamento de ações futuras (na alocação e desalocação dos trabalhadores) e em Teotihuacan o tabuleiro se mostrou como um enorme rondel para alocação e evolução de nossos dados. Em Tekhenu ficamos às voltas em torno de um obelisco que funciona basicamente como um contador de turnos/marcador de fases e um fator determinante no repositório para o draft de dados.
O Ciclo de Tekhenu se organiza da seguinte forma:
- O jogo é dividido em turnos, onde cada jogador faz uma ação na sua vez (draftando um dado)
- a cada dois rounds de turnos, o obelisco sofre uma rotação (isso basicamente muda a qualidade dos dados para o draft, além de travar alguns e adicionar e liberar outros)
- a cada duas rotações temos uma fase de Maat onde basicamente você fara o balanço dos pips das qualidades dos dados (puros x corrompidos) que draftou. Isso basicamente funciona para redefinir a ordem do turno e dar uma pequena penalidade em saldos muito negativos
- a cada duas fases de Maat (ou quatro rotações) vem aquela orgia de contagem de pontos pelo tabuleiro (característica da série)
- após duas fases de pontuação o jogo termina
Simplificando a matemática cada jogador terá exatamente 16 turnos durante uma partida e é isso. E para terminar de falar sobre regras (não estamos aqui pra isso), as suas ações são definidas pelo draft de um dado em um espaço em torno do obelisco, que estará associado a uma de 6 ações possiveis (e a um deus, mas esqueça tema nesse jogo porque ele é completamente inexistente, sendo uma mera ambientação).
O peso das decisões:
Um ponto que vale ressaltar, é que apesar das similaridades em suas propostas, algumas vezes até mecanismos, os jogos da série T são bem diferentes entre si. Eu costumo dizer que a experiência, o impacto que o jogo promove é basicamente a mesma, mas os desafios propostos e a condução do raciocinio lógico nas partidas são bem diferentes.
Ao contrário de seus antecessores, Tekhenu não é um jogo de grandes combos de pontuação, não espere aquelas jogadas que vão cascateando novas ações e gerando 30, 40 pontos num turno como víamos em Teotihuacan por exemplo. Aqui a sequência das ações é muito mais determinante do que a sua eficiência de forma isolada. Essa é uma característica de jogos com poucos turnos como Vinhos ou Pipeline por exemplo que acaba tornando o jogo mais estratégico do que tático pois não há muita margem de redirecionamento, ainda assim, o jogo traz bastante decisões substanciais. Principalmente na escolha da ação de gerar recursos. Semelhante à ação "pegar cacau" de Teotihuacan (que desperdiça todo o seu turno), a ação de produção de Tekhenu também gera uma certa dor de barriga, ainda mais aqui onde somente 16 turnos serão executados. A decisão fica ainda mais profunda quando nos deparamos com o dilema de o que produzir.
Como disse anteriormente os caminhos de vitória estão espalhados pelo jogo e basicamente o que vemos é que estão associados a recursos diferentes. Se quiser construir estátuas precisará de granito, se quiser focar nos pilares, sua produção de calcário será mais necessária, a maioria dos recursos não tem uso duplo e essa encurtada do cobertor deixa a escolha da sua sequencia de ações (e da fase de produção) extremamente interessante e que também gera desperdício de ações e produção de recursos com vasta frequênica em mesas iniciantes.
E focando ainda no exemplo da ação de produção de recursos para dividir um pouco da experiencia do jogo. essa decisão nos leva a mais um ponto de atenção, o mecanismo central do jogo, que é a rotação dos dados em turnos futuros. É muito importante que você saiba quais áreas dos deuses serão reabastecidas e quais dados serão proibidos. Do contrário, você pode ficar com recursos que são quase impossíveis de usar por quatro turnos (ou o resto do jogo). Claro que o jogo fornece uma maneira de acessar ações que de outra forma seriam inacessíveis (como a jogada de Anúbis), mas você deve pelo menos saber quando e onde um período de escassez de dados estará chegando. O jogo é extremamente matemático e permite esse acompanhamento, de cara por exemplo aconselho memorizar as terceira e sexta porções do obelisco (a partir do inicio do jogo no sentido horário), pois serão espaços que obterão mais dados do que outros e isso pode ser relevante pra sua estratégia além de ajudar no seu planejamento.

Caminhos possíveis e os desvios de Tekhenu:
Conforme falei anteriormente, Tekhenu tem um viés mais estratégico que tático e com poucas partidas já conseguimos identificar caminhos possíves, que geralmente se darão no combo de maximizar a combinação de duas ações (raramente 3) sinérgicas. Após mais de 10 partidas, percebi uma tendência na combinação Ra+Hathor como o caminho mais procurado pelos jogadores, essa dupla de ações basicamente foca na estratégia de pontuar os pilares e arredores dos templos (em um mecanismo de pontuação que lembra MUITO os das ruas de LISBOA), outra estratégia que tentei algumas vezes mas com mais dificuldade foi focar nas ações de Thot+Bastet que basicamente empurra seu nivel de felicidade pra frente (gerando a pontuação dos triangulos) e abre a compra de pontuacao de cartas. Há outras combinações possíveis e provavelmente a discussão de um ou outro caminho mais eficiente, mas achei as possibilidades razoalvelmente diversas pra gerar um fator ok de rejogabilidade.
Apesar de achar um bom jogo, algumas coisas poderiam estar mais desenvolvidas em Tekhenu na minha opinião. O Tema nunca foi o forte nessa série de jogos, mas parece que em Tekhenu ele foi isolado de vez do tabuleiro rs... se em Teotihuacan seus dados eram trabalhadores que iam evoluindo conforme sua experiencia (ou alocação), aqui em tekhenu os dados sequer representam algo (e olha que procurei em fóruns, reviews, e o máximo que encontrei foram interpretações pessoais de gente com boa vontade). A colagem do tema na série não faz muita diferença pra qualidade do jogo, porém a ausência dele torna menos intuitiva as conexões entra as ações e mecânicas em determinados jogos e achei isso muito evidente em Tekhenu. Nas primeiras partidas onde ainda não temos decorado todas as formas de pontuação e ações, achei pouco intuitivo o fluxo do jogo para a sua tomada de decisões, tendo que a todo momento ficar relemebrando o que cada ação faz, o que pontua no jogo e o que é necessário e onde encontrar os recursos prévios para maximizar aquela ação. Não há a ilustração de um objetivo que ajude a conduzir a lógica dos jogadores para obtenção de uma máxima eficiência.. E novamente, em um jogo de poucos turnos, qualquer ação desperdiçada fará uma boa diferença.
Coisas bobas também como um track de turnos para controlar melhor as fases do jogo e ser um controle a menos de contagem para os jogadores foi uma ausência que não entendi muito bem. (acabei de ver que já tem um arquivo no bgg para tal track rs). Algumas cartas de decreto me pareceram bem desequilibradas em relação a outras, e em algumas partidas geraram aquela torcida de nariz por parte de alguns rs.. e por fim, o jogo nao escala bem pra dois jogadores. Achei muito solto, e principalmente torna a fase de Maat (que reordena a iniciativa dos turnos) praticamente irrelevante, sendo que com 3 e 4 jogadores ela é PRIMORDIAL.
Conclusão:
Tekhenu é mais um ótimo jogo da série dos Ts, porém o que menos me empolgou. Isso não o torna um jogo ruim, muito pelo contrário, já que a referência é construída ao lado de ótimos jogos. Mas a sensação de diversão nessa experiência de jogos italianos estratégicos, se torna mais aparente nos dois outros da série (Tzolkin e Teotihuacan). Vale um adendo aqui que em todo momento estou excluindo Trismegistus desse grupo de jogos, porém tenho a enorme sensação que Trismegistus é um jogo basicamente de Frederico Pierlorenzi, com uma ajudinha do Tascini. Percebemos muito pouco do autor ali, apesar de que é disparado meu jogo favorito entre esses quatro.
Para quem busca um euro médio de draft de dados e já curtiu a experiência de estar às voltas com Tascini em seus outros T's Tekhenu surge como uma das poucas boas opções de jogos nesse ano tão ruim de lançamentos.
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