Um hobby, de um modo geral, possui certas características intrínsecas, dentre elas: a prática sem fins lucrativos (não impedindo o ganho com a prática, mas nunca é o foco do hobby), o colecionismo (quando possível), a aquisição de conhecimento sobre o assunto e a socialização de suas práticas.
Os jogos de tabuleiro não são exceção a estas e assemelham-se bastante a tantos outros hobbies deste mundo, que hoje é conhecido como "Cultura Pop" e a até pouco tempo atrás era só "coisa de nerd" mesmo, como quadrinhos, video game, RPG e tantos outros.
Isto porque, como todos estes, os Jogos de Tabuleiro exigem de seus entusiastas a dedicação para guardar, catalogar, aprender, pesquisar, enfim, tornarem-se especialistas no assunto (quem já conversou com um fã assíduo de quadrinhos sabe bem do que eu estou falando). Além disso o hobby definitivamente torna-se colecionável logo de cara, haja vista a imensa variedade de títulos disponíveis, havendo espaço para um aficionado colecionar "Todos os jogos do Uwe, com todas as expansões" ou "Todos os títulos da Fantasy Flight" e assim por diante.
Mas no final, um dos mais importantes, e, por incrível que pareça, o ponto mais complicado, para definir-se como fazendo parte de um hobby é a socialização.
Gen Con 2014
Veja, até mesmo ornitólogos precisam socializar suas atividades para, efetivamente serem chamados de ornitólogos. Mesmo que seja com seus sobrinhos que os vêm visitar a cada três meses para ouvir sobre a Arapuãna Azul que ele viu na semana passada, ou pela internet, no fórum internacional de ornitologia amadora.
Assim sendo, nós, jogadores de jogos de tabuleiro, os tão aclamados "gamers", precisamos no mínimo fazer nossos amados joguinhos saírem de suas caixas e verem um pouco de mesa de vez em quando (ou várias vezes, se você tem essa sorte!).
Uma opção são as reuniões em luderias, local onde nós, que amamos estas resmas de papelão e pecinhas de madeira, podemos nos reunir para proclamar essa paixão por jogos, e desfrutar de algumas horas de bate papo e jogatinas com gente que entende, e cuida, de board games tanto quanto nós mesmos.
Ocorre que, para alguns grupos, esta não é a opção mais costumeira. Eu incluso.
Para certos grupos, jogos de tabuleiro são sinônimo de reunião na casa de alguém (no meu caso, aqui em casa mesmo), acompanhados de alguma bebidinha, alguns quitutes e um bom bate-papo.
Eis então o ponto em que eu estava querendo chegar (que bela volta, hein?).
Quando você se reúne em casa com seus amigos, os quais, em grande parte, você conhecia antes de conhecer jogos de tabuleiro e que, não necessariamente dividem o apreço pelo hobby como você, começam pequenas neuras que eu gostaria de abordar aqui.
É comum rodar por fóruns estrangeiros, e até mesmo aqui no Brasil e achar discussões de "Como lidar com jogadores que ficam conversando na mesa?" ou "Como criei regras eficientes para abolir em definitivo o uso de celulares na mesa". Discussões estas com centenas, as vezes milhares de respostas, todas buscando a forma ideal de se doutrinar um grupo de jogo a formar a mais perfeita máquina de apreciação de board games jamais imaginada.
Imagem meramente ilustrativa
O que a maioria de nós esquece é que, tudo isso é a forma perfeita de curtir uma noite de boardgames que NÓS imaginamos.
Jogos de tabuleiro são, fundamentalmente um meio de diversão e socialização. Mesmo quando mais densos e cerebrais eles ainda visam o entretenimento dos indivíduos envolvidos e (pasmem!) a percepção de diversão de cada um de nós é absolutamente distinta.
Convidar amigos para nossas casas para, em seguida, submetê-los à expectativas irreais de formas de se divertir, que muitas vezes fazem sentido somente em nossas cabeças, acaba sendo uma experiência bem menos agradável do que poderia ser.
Deixar seus amigos beberem alguma coisa, baterem papo ou até mesmo usarem o celular na mesa não precisa ser o fim do mundo(!!).
Se o celular faz a pessoas demorar demais e atrasa bastante o jogo, converse. Diga que não há problema na usar o bendito celular, só que ela deve tomar cuidado para não arrastar demais a partida, a maioria das pessoas é capaz de fazer mais de uma coisa ao mesmo tempo e, acredito ou não, aquela sua amiga que não larga o telefone enquanto todos jogam pode estar muito mais ligada no que está acontecendo do que você, que está tão preocupado com a conversa de Whatsapp dela.
No momento em que esse tipo de consciência caiu sobre mim eu passei a ser uma pessoa muito mais tolerante (e agradável) numa mesa de jogos e, adivinhem só, meus amigos passaram a sair das sessões de jogo rindo muito mais, leves e contentes com o evento.
Uma sessão de jogatina não precisa necessariamente ser o ambiente de máxima adoração de tabuleiros, mas sim um tempo em que você constrói boas lembranças e momentos bacanas. São em sessões cheias de bate-papo e discussão de Terra Mystica, por exemplo, que você lembra meses depois das jogadas marcantes do Fulano que estava pilotando os Nômades.
Eu não estou aqui para dizer como você deve, ou não, receber seus amigos na sua própria casa, mas gostaria de discutir um pouco sobre essa sisudez que muitas vezes preenche os amantes mais assíduos do Hobby.
Levar muito à sério algo que foi criado para entreter não me parece algo bacana.
A não ser que estejamos falando de um torneio ou algo do tipo, mas não é esse tipo de encontro de jogatina que eu estou falando.
Enfim, vamos deixar nossos colegas brincarem e se divertirem com mais leveza, que é bem provável que, no final da noite, nós mesmos tenhamos nos divertido ainda mais, nas companhias de nossos amigos e de nossos jogos.
Forte abraço e até a próxima!
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