por Lucas Andrade - PUBLICADO EMhttp://onboardbgg.com/2015/07/31/sobre-a-mesa-cosmic-encounter/

Há incontáveis eras atrás, uma raça evoluiu até um estágio praticamente inimaginável. Os Precursores, contudo, estavam sós e partiram em uma busca interminável por outros seres. A busca foi, contudo, em vão. Enviaram, pois, sondas pelo Universo e espalharam as sementes da vida por todo o cosmo. Não se sabe o que aconteceu, mas muito, muito tempo depois de os Precursores terem desaparecido, algumas destas sementes produziram frutos. Seres de toda estirpe, algumas desenvolveram capacidade tecnológica e científica para descobrir os resquícios do aparato de viagem dos Precursores e começaram a fazer contato uns com os outros.
Este é Cosmic Encounter, um dos jogos de tabuleiro mais clássicos de todos os tempos, no qual cada jogador incorpora uma raça alienígena distinta, tentando estabelecer colônias em cinco planetas diferentes. Para tal, dependendo de sua espécie, você usará poderes de todo tipo, mas, independentemente de sua habilidade, negociação e diplomacia serão necessárias em algum momento.
Mecânica:
– Gerenciamento de mão
– Parcerias
– Poderes variáveis dos jogadores
Antes do início de uma partida de Cosmic Encounter, decidimos aleatoriamente quais raças utilizaremos. Apenas na caixa básica são cinquenta tipos, o que em uma sessão com quatro jogadores daria um total de 5.527.200 possibilidades! Cinco milhões com a caixa básica!!! Sorteiam-se duas cartas de raça e os jogadores escolhem qual delas prefere. A seguir, recebem as fichas de suas criaturas com todas as informações necessárias, dentre elas, a primordial, como você quebrará as regras do jogo! Por questões didáticas, veremos isso mais adiante. Vamos entender como funciona um turno.
Cada jogador tem cinco planetas com quatro naves em cada um. Antes de sua vez ele poderá recuperar uma de suas naves perdidas anteriormente e colocá-la de volta em uma de suas colônias-natal. O próximo passo é comprar uma carta do baralho do Destino. Você não escolhe quem visitará, o destino decide. As raças apenas utilizam os portões do hiperespaço deixados pelos Precursores, não sabem controlá-lo. Ao comprar uma carta, verifica-se a cor e o jogador atacante aponta o cone dimensional para um planeta alvo desta cor colocando de uma a quatro naves suas na entrada do portal. Não entrarei nas minúcias das exceções e casos particulares nesta matéria, por exemplo, nesta compra do deck do Destino existem outras situações possíveis.

Agora temos um dos melhores momentos de cada rodada. Primeiro, o atacante anuncia quais jogadores (raças) gostaria de ter como aliado neste encontro, exclusivamente. Os convidados não falam nada. Depois, a defesa faz a mesma coisa, anuncia quem gostaria que lhe ajudasse, podendo ser até mesmo quem já foi convidado pelo atacante. Começando pelo jogador convidado à esquerda do atacante, os possíveis aliados declaram se irão ou não aceitar alguma oferta. Aceitar dar apoio significa colocar naves no lado do qual ele concordou em colaborar.
Chegamos agora na fase de planejamento. Existe um outro baralho, o deck de Encontros, formado basicamente por cartas do tipo Ataque, com valores numéricos bem variados e Negociação. Existe outra também, mas sem exceções hoje, lembra. Atacante e defensor escolhem uma destas cartas e as revelam simultaneamente. Bom, pelo menos, a princípio.

Saber gerenciar a mão é fundamental
Se ambos escolheram cartas de ataque, somamos o valor da carta de cada lado, mais as naves próprias e as dos aliados respectivos deste encontro. O número maior vence. Chega a ser ridículo de tão simples. Se alguém jogar uma carta numérico de Ataque e o oponente jogar uma Negociação, este último que tentou conversar perdeu na hora. Rápido e indolor! Se as duas cartas forem Negociação, ambos os jogadores envolvidos diretamente (aliados, não) devem tentar um acordo em um minuto ou ambos sofrerão as consequências. Estes acordos envolvem geralmente troca de colônias ou cartas.
Voltemos às cartas de Ataque. Se alguma delas for usada, em caso de vitória do atacante, ele e seus aliados estabelecerão colônias no planeta alvo. O objetivo do jogo é estabelecer bases em cinco locais distintos, ou seja, não convide para se aliar ao ataque algum jogador com quatro colônias! Os derrotados são expulsos do planeta, indo para o warp, o vórtice, o limbo, o vazio existencial, o Nada, a falha espaço-temporal… Volta, Lukita!!! Sendo o primeiro encontro, se for bem sucedido, o atacante tem direito a uma segunda visita, comprando mais uma carta do baralho de Destino e o processo se repete…
The Warp! Noooooooooooo… (Foto On Board)
Se a defesa vencer, o atacante e seus aliados vão para o warp, vórtice, o limbo, o vazio exist… De novo? O defensor permanece em seu planeta e os aliados da defesa voltam para seus sistemas podendo colocar suas naves em quaisquer planetas, boa oportunidade para reforçar um planeta com poucas unidades. Além disso, para cada peça enviada como reforço, o aliado poderá comprar uma nova carta de encontro ou retirar uma nave sua do vórtice. Seja no ataque ou na defesa, alianças rendem bons frutos.
Temos outros fatores que podem apimentar este processo, artefatos, cartas com efeitos especiais, por vezes amplificados, inclusive, conforme a raça que as utilizam, mas o já consegui passar o principal.
E se eu disser que o melhor ainda está por vir? Se Cosmic Encounter fosse apenas o que descrevi acima, já seria um jogo divertido e leve de gerenciamento de mão e negociação. Mas este é um clássico com quase 40 anos, vejamos porquê.

Cada raça, como falei acima, tem um poder especial que altera alguma regra do jogo, sejam mudanças pequenas ou drásticas. Cosmic Encounteré um jogo totalmente assimétrico e você nunca terá duas partidas iguais, precisando se adaptar para lidar com os poderes dos oponentes e saber tirar proveito de seu próprio. Jogue com o Antimatéria, que transforma vencedor em perdedor e vice-versa e você
lutará para perder.
Jogue contra ele e inverta toda sua lógica tradicional de jogo. Ou o Pacifista que sempre vence se jogar uma Negociação e sofrer um Ataque. Que tal o Macron, cujas naves valem por quatro cada uma, um verdadeiro titã cósmico. E como deter a Máquina que não para de jogar após o segundo encontro? Enquanto for bem sucedida ela continua a jogar, continua a jogar, continua a jogar… Se o resto da mesa não se unir contra esta ameaça cibernética, muitos correm o risco de nem ver chegar a vez deles. Está lembrado que os derrotados vão para o Vórtice? Os Zumbis não vão! Ou que os jogadores revelam as cartas de encontro simultaneamente? O Oráculo vê a carta escolhida pelo inimigo com antecedência e assim para todas as outras raças. Cada uma deturpando os princípios das regras e transformando suas combinações em um novelo rico em possibilidades estratégicas ou psicológicas. Juntando as expansões, temos 130 tipos de alienígenas com suas habilidades próprias, criando a cada sessão um microuniverso de desafios.
Considerações Finais:
Conheci Cosmic Encounter há trinta anos atrás, através da versão não autorizada lançada no Brasil pela GROW chamada Contatos Cósmicos. Era criança e fui atraído pela caixa mostrando combate e invasão espacial e não entendi muito aquilo tudo quando li o manual. Parecia tão diferente da embalagem… Com o passar dos anos, consegui jogar como deveria ser e o fascínio foi imediato. Aliás, o fascínio começou mesmo quando ainda não tinha maturidade ou grupo para jogá-lo e passava horas, literalmente, lendo as fichas dos alienígenas, seus poderes, background e viajava por este Universo. Tanto que mantenho esta edição comigo até hoje.
Lukita e seu exemplar de trinta anos atrás. (Photo On Board)
As décadas passaram e veio a versão da Fantasy Flight com alguns pequenos ajustes, artes fenomenais para cada criatura e componentes com qualidade padrão da empresa e todo esse sentimento voltou. São muito fã dos jogos com alianças e negociações e sei que este estilo de jogo depende muito do grupo sentado à mesa.Cosmic Encounter tem a vantagem de funcionar melhor que muitos e muitos jogos do estilo por definir claramente o que você pode ou não fazer como aliado e quais serão suas recompensas, além de impor o tempo certo para cada coisa. Como todos os acordos são feitos em aberto, basta um sim ou não para colocar até o jogador mais tímido na ciranda diplomática do jogo.
Além disso, o desafio de usar uma estratégia totalmente diferente a cada sessão, porque você e seus oponentes têm poderes distintos transforma cada partida em uma experiência nova. Matematicamente é um dos jogos com maior rejogabilidade de todos os tempos, com mais de quatro trilhões de combinações possíveis utilizando todas as raças em uma mesa com seis pessoas. Pense nas adaptações necessárias.
O mais interessante é que o jogo é extremamente balanceado. Lembro de uma partida que eu era uma raça não tão poderosa jogando contra o Macron e o Warrior que vai ficando mais forte a cada vitória e mais forte ainda a cada derrota! No começo do jogo pensei: “f****”! Mas as alianças, o Destino, o entrelaçamento das habilidades permitiram que todos os cinco participantes estivessem empatados com quatro colônias nos últimos instantes! E pense em um final épico após isso!
Cosmic Encounter no playmat espacial. (Foto On Board)
Cosmic Encounter é um dos seletos jogos que entram em uma categoria toda própria e muito restrita para mim, dos que além de ter muita qualidade técnica, ainda tem ou um caráter nostálgico ou um tema muito querido, tratado de uma maneira diferente de outros jogos e ele tem ambas! É fascinante, divertido, leve, sempre renovado com infinitas possibilidades e representa o objetivo fundamental dos jogos de tabuleiro: reunir um grupo de amigos ao redor de uma mesa para gastarem horas conhecendo novos mundos!
Só tenha cuidado com o warp, o vórtice, o lim-
bo, o vazio exis-
tencial,
o Na-
da, a fa-
lha
es-
pa-
ço-tem-
p
o
r
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NOTA: leia também a entrevista exclusiva para o Brasil que o designer de Cosmic Encounter, Peter Olotka, concedeu ao On Board. AQUI.
Pontos Positivos:
– Regras simples
– Rejogabilidade como vista em poucos jogos
– Negociação fácil de conduzir mesmo entre os mais tímidos
– Mesmo sem expansão alguma há jogo para um século
Pontos Negativos:
– Nem todos os grupos entendem bem seu propósito, podendo decepcionar